31/05/19
Cigarro já foi chique
O Dia Mundial Sem Tabaco me lembrou uma série de besteiras que fazíamos na adolescência em relação ao cigarro e casos curiosos de alguns fumantes.
Os anos 70 e 80 tinham outra realidade, onde o cigarro era status, graças à massificação nos filmes e na tevê.
Naquela época, fumar era "chique" e a maneira de segurar o cigarro definia quem voce era. Uns seguravam com a mão meio mole, fazendo o tipo descolado. Sem dúvida uma inspiração dos filmes de Bogard.
Outros gesticulavam com o cigarro na mão, usando como se fosse uma arma para marcar e reforçar sua opinião.
Tinha quem queria ser diferente e segurava o cigarro ao contrário, voltado para dentro da mão. Para puxar a fumaça, outros estilos.
Um segurava o troço com os dedos indicador e médio, fazendo gestos lentos, imitando os ricos dos filmes.
Outro com o polegar e o indicador, pose mais parecida com os policiais e bandidos do cinema daquela época.
Soltar a fumaça também tinha seus estilos, pela boca e o nariz, pela boca aos poucos, pela boca fazendo rodinhas no ar ou em várias soltadas.
Apagar o cigarro tinha variantes como jogar na xícara de café, esmagar no cinzeiro, jogar no chão e pisar com a ponta do sapato, jogar longe com um peteleco.
Era comum tirar foto "pensativa" com o cigarro na mão levantada ou apoiada na cabeça. Ou ficar com ele pendurado na boca, fazendo pose de malandro.
E os acessórios? Carteiras de couro para os maços de cigarro, com bolsinha para acomodar o isqueiro. Brega.
Havia outros usos para um cigarro, como ser pavio de bomba-relógio ou esfregar no parabrisa se o limpador quebrasse durante uma viagem de carro na chuva.
Dizem os fumantes que o cigarro acalma, mas desconfio que sua função sempre foi social e não física.
Um amigo meu disse que começou a fumar, com 15 anos, porque lhe dava mais segurança na hora de abordar meninas. Além disso, achava bonito. Outros começaram porque queriam parecer adultos, muitas vezes imitando os pais.
Eu fumei exatamente um ano e comecei para entrar em filmes proibidos para menores.
Explico. O Cine Marabá, que passava filmes adultos, tinha um porteiro chamado Barrão, que fazia juz ao nome e sempre me barrava, mesmo com sapato plataforma e cara fingindo ser adulto.
Até o dia em que observei que ele deixava entrar todos os que estavam com um cigarro na boca, mesmo aquele que eram obviamente menores. Daí...
Como não queria ser só mais um fumante, fumava Rothman's, Saint Moritz ou Pall Mall, cigarros chiques.
Não tragava, porque sempre achei horrível, e parei um ano exato depois. Um dia olhei para o cigarro e decidi que não queria mais fumar.
Costumo dizer que as pesssoas que fumam há muito tempo não param porque o fumo derreteu o cérebro.
Tenho exemplos. Um amigo de meu pai, Raleu, teve infarto e foi flagrado fumando no quarto do hospital, quase sem fôlego. Um meu, Carlos Ulisses, também fumou no hospital, infartado.
Quando param, muitos engordam e ficam loucos para fumar de novo quando passam perto de alguém com cigarro.
No meu caso foi o oposto. Continuei seco e desde a época detesto o cheiro do cigarro, que deixa o fumante fedorento. Pior ainda se for mulher.
Uma das maiores e mais importantes conquistas do Brasil nos últimos 20 anos foi a redução dos fumantes no Brasil, a ponto de Salvador só ter 4,2% da população com o vício.
Um amigo sacana diz que só é assim porque a maioria passou a fumar maconha...
Esta conquista, que deve ser toda atribuída a José Serra, quando era ministro da Saúde no governo FHC, salvou a vida de milhões de pessoas e, segundo uma pesquisa recente, 15 mil crianças em 10 anos.
Todas as medidas foram dele, como proibir propaganda valorizando o ato de fumar, marcas nos pontos de venda, fumar em espaço fechado.
Hoje aquela época do cigarro chique está morta e isso é uma grande conquista.
Mas era engraçada...
Cidades sem defesa
Fazer jornal no interior da Bahia nunca foi bom negócio. Poucos até ganharam algum dinheiro vendendo sua ética, sua publicação, sua alma para os prefeitos corruptos. Receberam para contar mentiras e defender os patrões de denúncias. Muitas vezes seus empregados estavam na folha da Prefeitura.
Os raros jornais que não se vendem sempre foram feitos por teimosia, por acreditar na missão de defender a sociedade dos corruptos, por querer uma cidade melhor para se viver. Estes sempre tiveram muita dificuldade em pagar as despesas e o pessoal, mesmo vendendo muito nas bancas.
A explicação é simples. Voce paga R$ 2 na banca por um jornal que custa R$ 15 para ser escrito, montado, impresso e distribuído. A diferença, em cidades maiores, onde os anunciantes e agências são mais esclarecidos, é bancado pela publicidade. Sem ela, a venda em banca não "banca" nada.
Porém, mesmo em cidades com empresas que anunciam em jornais, a recessão causada pelo desgoverno de Dilma Rousseff (PT), a partir de 2014, fez a maior parte delas perder vendas e clientes. Com isso, tiveram que cortar toda publicidade nos jornais, que entraram em crise.
A facilidade de pegar notícias pela internet, de graça, também contribuiu para a crise, mas nem tanto. As vendas de jornais independentes e sérios na forma impressa ainda tem muita demanda, como acontece com A Região no sul da Bahia, onde vende todos exemplares que coloca nas bancas.
A falta de publicidade é a verdadeira causa da morte de jornais, incluindo alguns de longa data, como o Tabu, de Canavieiras, que sobreviveu por 50 anos mas sucumbiu à grave recessão e hoje é apenas online. Ou jornais centenários que conseguiram passar por todas as crises do país, mas não aguentaram Dilma.
O jornal Comércio do Jahu, por exemplo, tinha 101 anos. Único jornal ainda circulando em Jaú (SP), cidade de 119 mil habitantes, ele fechou nesta semana (impresso e online). O dono, Raul Bauab, explica: "jornalismo sério e responsável custa caro. Aqui, pelo menos, as pessoas não querem pagar por esse serviço".
Em Itabuna é igual. Todos querem um jornal, rádio, tv que os defenda, que informe com precisão, desde que seja... de graça. Como se o trabalho de buscar e checar a informação, ir aos lugares, ouvir as pessoas, escrever bem e imprimir não custasse um único centavo.
A editora do Comércio do Jahu, Ana Karina, completa: "hoje, muitas pessoas não querem pagar pela informação de qualidade, que segue os princípios éticos. Acreditam, infelizmente, que postagens nas redes sociais bastam para que fiquem informados". E este é o maior problema. As postagens não informam, deformam.
Sem jornais, as notícias falsas tomam conta de uma cidade. Jornais se dedicam a checar os fatos, questionar dados, pesquisar, analisar a fundo o que está acontecendo. A prioridade é dar a notícia sem erros. Na midia social e nos blogs a prioridade é a rapidez, dar a notícia imediatamente.
Blogs e contas de rede social não têm recursos para apurar uma notícia. Muitos não tem a formação necessária para analisar fatos e compreender dados. Outros não conseguem resposta de autoridades apenas porque são blogs e não veículos tradicionais.
Mesmo com rádios que tenham jornalismo próprio e sério, como a Morena FM, não é a mesma coisa, porque o jornal pode ser lido com calma, o que facilita o entendimento.
O jornal também pode ser guardado, relido para tirar uma dúvida. É perene, enquanto o noticiário do rádio é poderoso, mas precisa ser entendido de imediato e não pode ser "reouvido" se tiver dúvida.
Por isso, uma cidade sem jornal é uma cidade vulnerável, sem defesas contra prefeitos e vereadores corruptos, que vão enriquecer usando o dinheiro que o cidadão entregou na forma de impostos.
É uma cidade exposta a golpes e fraudes, porque não foram denunciadas no jornal. É uma cidade indefesa.
Corruptos antigos tinham como prática matar o jornalista para calar o jornal (leia sobre a morte de meu pai, Manoel Leal, nesta edição). Hoje eles não precisam. A recessão do PT está calando um por um.
22/05/19
A comida requentada de Tite
No Mesa Pra 2 (Morena FM, quartas, 15h) desta semana comentei com Mary Barros que Tite ia insistir em chamar Felipe Luiz, Fagner, Miranda e Thiago Silva, que não servem para a próxima Copa. Não deu outra. Chamou mesmo, mas já foi um avanço não convocar Renato Augusto e Paulinho...
Tite acertou em chamar Marcelo e Dani Alves, mas pelo motivo errado. Vai usá-los como laterais, função que já não cumprem bem por causa da idade. Os dois não têm fôlego para correr todo o lado do campo, deixando Casemiro se virando para proteger as bolas nas costas.
Todas as seleções sabem dessa deficiência e usam, como a Bélgica usou, lançando dezenas de bolas nas costas do Marcelo sem Casemiro em campo para proteger a defesa. O resultdo voce conhece. Sem Casemiro, não era uma partida para Marcelo e sim para Felipe Luiz.
Voltando a Dani e Marcelo. Nos clubes, eles não são mais usados como laterais e sim como meias, ligando a defesa com o ataque sem a preocupação de defender. O resultado tem sido excelente no Real Madrid e no PSG, onde os dois vem dando show na nova função.
Claro, Tite não abre mão de seu velho esquema 433 nem de usar os caras como laterais. Além desta deficiência da seleção, os times conhecem outra que vão explorar: Tite sempre escala Neymar pela esquerda e, com isso, o time fica manco, jogando só por este lado.
A solução é parecida com a que o PSG faz às vezes, colocando Neymar como meia atacante, comandando o ataque. O adversário nunca sabe se ele vai partir para driblar a defesa, passar para o atacante da esquerda, para o da direita ou fazer pivô para um jogador vindo de trás para chutar.
Fica imprevisível. Mas parece que Tite tem alergia a isso, prefere a previsibilidadae que deixa a seleção vulnerável. Não me entenda mal. Eu gosto do Tite, respeito muito, elogio por ter dado ao time uma maneira de jogar consistente, depois de anos sem formatação. Mas ele precisa variar.
Guardiola e Klopp, para ficar em dois, têm sua maneira padrão de jogar, conhecida por todos. Mas ambos mudam isso várias vezes durante a partida e surpreendem os adversários. É comum, durante as partidas, a formação mudar para 3133, 3232, 3241, 4123, 4141, até 424. Tite não muda.
A diferença entre os convocados por ele e por mim não está só na idade e sim na função. Como prefiro um time sem laterais, com 3 zagueiros, num 3232, não chamaria Alex Sandro apesar de ser fã dele. Montaria o time com Alisson e Ederson de reserva. Não chamaria terceiro goleiro, não faz sentido.
A defesa seria jovem, visando a Copa, com Diego Carlos, Marcelo e Marquinhos (Jemerson, David Luiz, Felipe); depois Casemiro (Fabinho), Marcelo e Daniel Alves (como meias, tendo Allan e Arthur na reserva); Neymar (Oscar), Douglas Costa e William (Richarlison e Coutinho); Firmino e Hulk na frente, com Gabriel Jesus na reserva dos dois.
Na defesa inclui David Luiz como reserva, apesar da idade, pela capacidade de lançamentos longos e certeiros que, a depender de como o adversário está jogando, pode ser uma ótima opção. Já mostrou isso em jogos do Chelsea contra times que jogavam no contra ataque deixando espaços atrás.
Minha lista e a do Tite têm em comum Marquinhos, Casemiro, Arthur, Allan, Coutinho, Neymar, Firmino, Gabriel Jesus, Richarlison, Marcelo e Dani Alves. Mas eu chamaria Hulk no lugar do Everton, Oscar no de Paquetá, Wiliam no de David Neres (mas ele também é ótimo), Fabinho no de Fernandinho, além da defesa nova.
Para mim, ganhar a Copa América é irrelevante. Nunca fomos muito fortes nela. O último título foi em 2007. O ideal seria usar a competição para criar entrosamento entre os jovens que devem disputar a Copa, testar estratégias e jogadas, conhecer os pontos fracos para corrigir até 2022. Sete dos principais chamados por ele não vão à Copa, incluindo a defesa toda.
Eu espero que Tite prove que eu estou errado e sua convocação é a certa. Porém, mesmo assim, ele terá que montar uma seleção completamente diferente para a Copa, começando quase do zero, sem entrosamento dos jogdores.
Como as datas Fifa são poucas, a preparação será prejudicada e insuficiente. Em especial para ter uma defesa toda nova jogando de forma harmoniosa, se entendendo em campo "por telepatia". Tite corre o risco de repetir João Saldanha em 1970.
03/05/19
Liberdade? Que liberdade?
O 3 de Maio foi o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, mas que liberdade é esta? Para mim, a liberdade de investigar, apurar, questionar autoridades e dados, divulgar tudo o que encontrou e opinar sobre o resultado sem ser patrulhado pela esquerda ou direita, sem ser censurado pelo STF, sem ser assassinado.
Liberdade de imprensa só existe se for plena e é imprescindível para a democracia. Todos os países democráticos têm previsão para o sigilo da fonte, por exemplo, mas ele nem sempre é compreendido. Não se trata de uma fonte anônima. O jornalista conhece a pessoa, a investigou e resolveu acreditar nela.
O jornal não revela o nome para que ela não seja perseguida e até morta. Aliás, no Brasil é perigoso até assinar uma reportagem, coisa normal no exterior. Vários jornalistas foram mortos porque a matéria com a denúncia tinha seus nomes como autores.
Na década de 90 nada menos que 10 jornalistas foram mortos na Bahia, sem que nenhum caso tenha sido efetivamente investigado, até porque os suspeitos eram aliados de quem mandava na polícia. O 10º foi meu pai, Manoel Leal, num caso que só foi investigado porque contei com o apoio da imprensa e entidades mundiais.
Mesmo assim, os mandantes nunca foram investigados, nem mesmo sendo óbvios. Matar meu pai foi a maneira que encontraram de calar o jornal, mas não deu certo. A equipe continuou resistindo e denunciando. Por isso, partiram para outro tipo de atentado, o jurídico.
Ao longo dos anos, o jornal A Região foi seguidamente processado com pedidos de danos morais feitos por gente sem moral alguma. A justiça local nunca deu ganho de causa a eles, preservando o papel fundamental da imprensa. Mas o mesmo não se aplica a nível nacional.
O corrupto condenado José Dirceu conseguiu vencer um processo, julgado em tempo recorde e sem respeitar o foro legal, porque não gostou de dois parágrafos do texto que o citavam. O texto de opinião, que por isso é protegido pela Constituição (ou deveria ser), comentava a investigação sobre a morte de Celso Daniel.
O prefeito de Santo André, segundo o Ministério Público de São Paulo confirmou em investigação, ia denunciar um esquema de propinas cobradas das empresas de ônibus da cidade, cujo dinheiro era entrregue à direção nacional do PT. Foi morto antes de denunciar. Todas as testemunhas foram mortas nos anos seguintes.
Minha liberdade de impresa foi amassada, rasgada e jogada no lixo junto com outra liberdade que a Constituição protege, a de opinião. A Justiça da época me negou as duas. Por isso, não é porque no Brasil temos uma relativa liberdade (desde que não incomode quem tem poder) que podemos comemorar o 3 de maio.
Liberdade de imprensa e de opinião, por aqui, são ainda um sonho distante.
Iniciativa boa, mas restrita
Venho escrevendo sobre isso há tempos, cobrando uma providência e pelo menos na Bahia apareceu uma. Um projeto de lei do deputado Rosemberg Pinto proibe ligações de cobrança fora do horário comercial, nos fins de semana e feriados.
É bom, mas não resolve quase nada. Primeiro porque as empresas vão continuar ligando dezenas ou centenas de vezes dentro do horário comercial. Segundo porque o projeto libera a hora do almoço (que deveria estar proibida). É imoral que não seja.
Terceiro porque é restrito a empresas baianas ou que operam na Bahia. A maioria delas está sediada fora do estado. Além disso, o PL manda o dinheiro das multas para o Procon. O justo seria que as empresas abusivas pagassem diretamente ao consumidor abusado por elas, com créditos na conta de telefone.
O projeto de lei que precisamos tem que ser nacional, com efeito geral e muito bem fiscalizado. Precisa não só proibir as ligações fora de horário comercial, do almoço (12h às 13h), nos finais de semana e nos feriados, como restringir a, no máximo, duas ligações entre 8h30 e 18h.
Não se esqueça que serão duas de CADA operadora, ou seja, ainda pode ser um inferno. Menor que o atual, mas ainda quente. Outra necessidaade é a de pagar a multa diretamente ao usuário infernizado. Não só é justo, como vai inibir as ligações abusivas. Vai chegar uma hora em que a conta será menor que as multas.
O deputado Rosemberg Pinto merece aplauso pela iniciativa, mas deveria conversar com a bancada federal baiana para que a lei seja mais ampla e eficiente, garantindo de verdade a tranquilidade das pessoas em seu momento de descanso e no almoço.
Se fosse possível, minha proposta seria a de redirecionar cada ligação para a casa dos donos das empresas que contratam os call centers. Isso sim seria justiça.