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18/09/19
O dano coletivo dos MPs
Tem algo de muito errado com o destino das multas que os Ministérios Públicos estadual, federal e do trabalho cobram por "danos morais coletivos". Esse dinheiro, cobrado de quem prejudicou pessoas específicas, deveria ser dado às vítimas e não a um uso obscuro, em geral não divulgado.
O dano moral coletivo existe, segundo a lei, quando uma empresa fere normas como instalações insalubres, não contratação de deficientes ou de aprendizes, discriminação, trabalho escravo, assédio moral ou sexual, atos anti-sindicais e fraudes trabalhistas.
Ninguém sabe ao certo onde são usados os bilhões de reais arrecadados desta maneira. No caso da Justiça do Trabalho, muitas vezes é o juiz local quem decide o destino do dinheiro e alguns o usam para promoção pessoal visando subir na carreira, partir para a política ou simplesmente por vaidade.
Existem casos estranhos. Uma multa paga pela Prefeitura de Goiânia por danos morais coletivos, devida porque ela não aplicou o dinheiro das multas no setor de trânsito, foi destinada à própria Prefeitura para "reestruturar a secretaria municipal de trânsito". Qual a lógica disso?
Não está punindo a Prefeitura, já que devolve o dinheiro a ela. Ao mesmo tempo interfere em um poder soberano ao dizer em que cada centavo deve ser gasto dentro da secretaria. O MP se torna, assim, o executivo, administrando esta parte de uma Prefeitura.
Ainda por cima, se tudo correr bem, o prefeito que causou o dano é quem vai se aproveitar politicamente da "realização" em sua campanha para a reeleição ou promover seu candidato. Não adianta dizer que foi fruto de multa, o marketing eleitoral vai falar mais alto.
Em outros casos, o roubo de dinheiro público por um prefeito, governador ou presidente não gera "dano moral coletivo". Por que não? Não existe dano maior à coletividade que roubar o dinheiro que deveria ser usado na saúde, educação, segurança, infraestrutura ou serviços sociais. Lula e Cuma, por exemplo, deveriam pagar pelos danos.
A destinação às vezes não faz sentido. Muitas decisões encaminham multas e indenizações causadas por infrações trabalhistas para o fundo de proteção da infância, mas o que a infância tem a ver com infrações trabalhistas? Nada. O dinheiro deveria ir para treinamento de mão de obra ou o FAT, por exemplo.
Quando não é destinado a uma coisa específica, o dinheiro vai para "fundos protetores de clientelas específicas (idoso, criança, adolescente, deficientes etc), ao FAT ou a entidades filantrópicas, sem fins lucrativos, por meio de doações em espécie ou in natura, sujeitas à prestação de contas".
O problema é que a sociedade, que gerou a multa por supostamente ser afrontada, nunca vê esta prestação de contas. Se ela efetivamente existe, é do conhecimento apenas dos MPs. Deveria existir uma lei obrigando a divulgação, em jornal e internet, destas prestações de contas. São meios adequados para isso.
No site do MPT não existe nenhuma opção para saber o destino das multas e indenizações, nem mesmo na seção "transparência". Pelo menos no site deveriam estar cada doação e a correspondente prestação de contas. Nos sites do MPF e do MP-BA também não existe qualquer informação.
Os três MPs, tão ciosos em cobrar transparência dos outros, agem sem transparência alguma quanto à destinação de bilhões de reais, como se não tivéssemos o direito de saber a quem deram o dinheiro que, em última análise, foi tomado em nome da população.
Existem muitos casos de uso das indenizações e multas para interesses pessoais ou de militância do juiz que decide. Um exemplo ocorreu em Campinas, onde uma multa de R$ 1 milhão imposta ao Itaú teve metade do valor repassado ao sindicato "para ajudar a sobreviver" depois das mudanças "impostas na reforma trabalhista".
Existe ainda a imoralidade das regras eleitorais. Voce sabia, por exemplo, que as multas cobradas dos partidos é repartida de volta para os mesmos partidos? Funciona assim. Um partido não brincou segundo as regras, então ele paga uma prenda aos outros. Detalhe: ele também recebe sua parte na divisão.
São coisas como estas que afastam investidores estrangeiros do Brasil. Eles simplesmente não entendem como um país pode conviver com atitudes e regras tão escandalosas. Nem eu.