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17/05/20
O comércio no pós-coronavirus
Não vai existir "volta à normalidade". Aquele normal não existe mais. O que vai aparecer é a nova economia "normal". O setor turístico, por exemplo. Quanto tudo for liberado, nem por isso será fácil viajar nas férias. Haverá menos empresas aéreas, com menos aeronaves e menos destinos, com passagem mais cara.
Os hotéis no destino também serão menos, com preços mais caros e dificuldade em achar um quarto vago na alta temporada. Alugar um carro será igualmente difícil. Usar o transporte público será uma boa opção apenas em lugares onde ele foi preservado, que não serão muitos. Viagens curtas no próprio estado aumentarão.
Tomar café numa mesinha na calçada, fazer um lanche, almoçar num restaurante ou comer uma pizza à noite será algo muito limitado, seja pelo fechamento de boa parte deles (se estima em metade), seja pelos preços mais altos, com maior custo de alimentos e serviços. Mas o setor deve voltar a crescer rápido, com novos operadores e maior demanda.
O uso das máscaras vai virar rotina em restaurantes, bares, salões de beleza e em empresas com atendimento direto ao público. Fabricar e vender máscaras será (já é) um negócio rentável e permanente. O delivery, não só de de comida como de qualquer outra coisa, vai explodir nas cidades.
Os lojistas finalmente vão manter permanentemente o que sugiro desde 2000: um site vendendo para a própria cidade, com entrega no mesmo dia usando motoboy ou carro da firma. Isto vai reforçar o poder econômico das lojas locais, gerar empregos e trazer de volta as vendas tomadas pelas grandes redes online nos últimos anos.
As lojas físicas tenderão a ser menores, mais preocupadas em servir como mostruário e cativar clientes que para efetuar a venda dentro dela. As mais inteligentes vão criar nas lojas atrações como desfile de nova coleção para grupos de clientes (roupas e sapatos), demonstração de eletros, aulas e cursos ligados aos produtos que vende.
A necessidade de espaços menores vai mexer com o mercado imobiliário e facilitar a aparição de pequenos "malls" com 20 ou 30 lojas pequenas e opções de alimentação, uma espécie de micro-shopping. Eles poderão ser instalados em terrenos pequenos, em área aberta, com investimento infinitamente menor que o de um shopping center.
O próprio shopping poderá dividir lojas maiores em duas ou mais menores, acompanhando a tendência de necessidade reduzida de espaço. Com isso poderá ter uma diversidade maior de produtos e serviços, aliados à praça de alimentação, cinema e outras atrações de lazer.
Lojas grandes vão virar galerias com 10 ou 20 lojinhas, que vão faturar mais com a venda online e entrega em casa do que com as físicas no local. A revolução no formato do comércio de rua vai diminuir o fluxo de carros, a necessidade de ônibus e de estacionamentos no centro.
Lojas que terão a maior parte das vendas online, seja via site ou WhatsApp, poderão ser instaladas em qualquer lugar, sem a obrigação de estar no centro ou em bairros com mais comércio. Esta mudança vai impactar no uso do transporte público, já que a tendência será contratar pessoas do próprio bairro.
A menor necessidade de vendedores in-store vai ser compensada com a maior de entregadores, de pessoal qualificado para o controle das vendas online e das entregas. A explosão do delivery vai aumentar as vendas de motos e as oficinas de sua manutenção. Surgirão empresas dedicadas a motoentrega das outras.
As lojas de eletros, eletrônicos e materiais de construção mais espertas vão incluir a instalação no processo de entrega, gerando demanda por profissionais como eletricistas, montadores, instaladores, pedreiros, encanadores e cursos técnicos para enfrentar esta necessidade.
Restaurantes e bares serão exceção. Apesar do reforço no faturamento com delivey, o forte continuará sendo a operação física, que até deve aumentar nos próximos anos devido à demanda psicológica reprimida. As pessoas darão mais valor aos encontros com amigos e a sair para comer fora.
A maior concorrência, com mais lojas no mercado, e a necessidade de firmar no consumidor o costume do delivery vai gerar uma maior demanda por mídia de massa, principalmente o rádio. A consequência será, em pouco tempo, uma "fila de espera" por espaço para anunciar, porque a lei impõe limites de propaganda por hora.
Poucos setores, como padarias, supermercados e frigoríficos, continuarão mais ou menos como hoje. Os outros enfrentação uma mudança radical na maneira de vender e no comportamento do consumidor.
Vai se dar melhor quem entender que a economa de antes não existe mais.
Ela se divide entre AC e DC. Antes e Depois do Coronavirus.